terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Crítica: Superhero 2044

O primeiro jogo de RPG para o gênero de super heróis. Reconhece alguém?

No começo de nossa jornada ficou claro que o originador do "Heroísmo Interativo", John Dunn, via seu jogo assim como os de seus colegas (Os "Atarizeiros', "Clube do Atari" ou alternativamente "Aqueles caras que trabalhavam na Atari".) como uma versão eletrônica dos "jogos de mesa".

Para contrastar tal sentimento e para entender melhor a origem dos Justiceiros Jogáveis, que tal olharmos para trás para o primeiro jogo de RPG do gênero, Superhero 2044?

Bem vindo a Inguria!

Esses ladrões de banco vieram preparados

Antes mesmo de explicar o sistema, o que é o gênero de super heróis ou qualquer coisa que possa situar o jogador e possíveis "Juízes" (como a década de 70 gostava de chamar narradores de RPG. É uma referencia ao passado Wargame (Jogo de Guerra, uma modalidade entre jogos de mesa) que ainda era bem próximo da modalidade de jogo.), o livro abre explicando de onde veio a inspiração do autor para criar um jogo no gênero de Supers. Aparentemente, em campanhas mais antigas de D&D, ele e seus colegas foram parar em outros mundos, lutando guerras espaciais, sendo agente secretos e interagindo com personagens como Luke Cage e Dr. Estranho para derrotar dragões.

Basicamente, os heróis de sua imaginação pulavam lado a lado com os elfos e anões e roubavam a cena ao tal ponto que o autor decidiu criar um sistema para aprisiona-los. Ou ele apenas queria finalmente jogar um jogo onde Luke Cage socando pessoas fosse algo quantificado em regras. Ambas são teorias válidas, mas a segunda é mais plausível.

"Quando meus homens me avisaram que um negro maluco estava no avião do quarteto fantástico, eu sabia que era você!"
"Onde está me dinheiro, doçura?"

De qualquer forma, outros pontos que nos mostram que estamos lendo um livro de rpg produzido na década de 70 é a menção que o jogo pode ser facilmente jogado por até vinte jogadores (!) e sem um Juiz (!!). Ao menos o livro tem regras que auxiliam essas duas empreitadas como veremos mais abaixo.

Após a introdução, o livro mergulha de cabeça em seu próprio cenário: Inguria no ano de 2044. 

Inguria é a maior potencia mundial em 2044. Com boa parte do mundo devastado por vazamentos nucleares e outras pequenas catástrofes, boa parte do desenvolvimento da humanidade se concentra nessa "Ilha do Futuro". Lá é o quartel general da Policia da Ciência e onde a Liga Liberdade de Super Heróis (The Freedom League of Super Heroes) faleceu lutando contra o malvado Dr. Ruby dois anos antes de quando se passa o jogo (Em 2042).

Qualquer cenário de RPG com uma policia cientifica vale a leitura

Tal policia não dá conta dos crimes permitidos pela alta tecnologia e a facilidade do uso de computadores, por isso muitos mutantes radiativos vestindo roupas coloridas acabam a auxiliando, patrulhando por super crime e salvando a população. 

Esses "mutantes" são os Super Heróis do jogo, e com quem os jogadores jogam. 
Nossa como eu amo os anos setenta! 

O poder dos jornais

Além de descrever os apetrechos tecnológicos e como a sociedade de 2044 é avançada tanto mentalmente quanto politicamente quando comparada a outras épocas, há uma passagem que define dois jornais rivais de Inguria. Um deles fala positivamente de heróis e da policia em geral, dando destaque até mesmo para heróis menores e sem importância (Os personagens dos jogadores no começo de carreira, por exemplo). Já o outro menciona dos problemas que os heróis causam e como a população reage a tais super seres.

O livro então menciona como o Juiz poderia construir chamadas para os jornais no começo de cada sessão não apenas para mostrar para os jogadores como Inguria está reagindo quanto suas ações e erros na cidade, mas expandir um pouco o escopo do "mundo de jogo", mostrando como NPCs heróis estão agindo e os problemas que estão enfrentando. 

Ciborgue com o cérebro humano que pode mudar de formas

A arte do livro é um dos pontos altos.

Fechando o capitulo de Inguria, há uma descrição de "locais interessantes" - Um deles é um "Super Shop" onde jogadores podem gastar dinheiro adquirido por patrulharem o bairro em diversos equipamentos e objetos, ou se estão sortudos, tentarem sua sorte em um "Grab Bag". Onde o personagem pode tirar desde itens consumíveis importantes como baterias para seus apetrechos tecnológicos a ursos congelados. 

"Oh um animal silvestre? Mais sorte da próxima vez!"


Mas isso não é nem de longe a parte mais estranha dessa loja. O atendente dela é o único sobrevivente da Liga Liberdade de Super Heróis. Tudo o que restou nele foi seu cérebro, ao qual ele pode fazer assumir qualquer forma, desde que não seja muito maior do que um tijolo. E ele habita o corpo de um robô.  Superhero 2044!

Supehomem, Homem-de-Ferro e...Tarzan?

As três "classes" de Super hero 2044

Com o cenário de jogo introduzido, o livro então passa a descrever como criar um personagem. Se escolhe uma das classes acima (Unique - Baseadas em Superhomem. O foco de tal classe é no poder interno do personagem, Toolmaster - Baseada no Homem-de-Ferro, os poderes são aparatos tecnológicos e finalmente Ubermensch - Baseados no Tarzan, descreve humanos no seu ápice físico.) e então distribuir 140 pontos entre os seguintes atributos:  Vigor (Vigor físico), Stamina (O Folego do personagem), Endurance (Constituição), Mentality (A inteligencia), Charisma (O carisma), Ego (O poder mental do personagem) e Dexterity (A destreza do personagem).

Então se aplica aos atributos bônus e penalidades associado as classes, como no diagrama a seguir.


A classe baseada no Tarzan tem uma penalidade em inteligencia!


E é isso ai. Fica só faltando comprar equipamentos e poderes para os personagens e o jogo já pode começar. Superhero 2044 é o primeiro jogo de rpg que se usa de um sistema "compra por pontos".
Note que não há regras para criação ou compra de poderes. Os personagens de exemplo do livro tem poderes completamente arbritários e criados em suas fichas pelo autor do livro. Eram tempos mais simples, mas faz a criação de personagem de Superhero 2044 ser muito difícil para jogadores que não compreendem muito o design de jogos. O Juiz teria que estudar muito o sistema a fundo e tentar criar junto aos jogadores as mecânicas para os poderes de seus personagens.

Ou você pode simplesmente jogar com o Justiceiro e ter "armas de fogo" como super poderes.


Note que o texto em inglês acima fala de coisas como "LOCATE handicap" e "PREVENT score". É meio confuso mas esses termos ficaram mais claros nos capítulos seguintes do livro.

E finalmente, o combate do jogo. Quase como uma tradição de jogos da decada de 70, ele consiste em rolar 3d6 (Três dados de seis faces. Aqueles que vem com o War) e comparar em uma tabela com o numero de Stamina do inimigo para ver se o acertou. Dano é já pré estabelecido no equipamento do personagem e quem sofre perde pontos tanto em Stamina e Vigor. 

O que significa que quanto mais um personagem sofre dano, mais enfraquecido e cansado ele fica pois há uma tabela que dá várias penalidades a personagens com seu Stamina baixo. Ataques mentais sofrem a mesma regras, mas machucando o Ego do personagem em vez de seu Vigor. Finalmente, há um sistema completamente diferente para ataques feitos por projeteis. O atacante rola 1d6 e modifica em uma tabela de "contexto" (Como por exemplo, estar atrás de caixas ou muito longe de seu alvo). O resultado do primeiro número é a dificuldade a ser vencida pelo rolamento de dados seguinte. Se o golpe atingir, se rola ainda outro dado (Agora um de 10 faces, um d10) para ver onde o alvo foi atingido. 

Golpes de transformação tem exatamente a mesma regra, mas ao em vez de dano transformam partes do corpo de quem recebe tais golpes.

Planejamento Semanal

Personagens criados, sistema de combate lido. E quanto a campanha? Os nossos Super Heróis irão combater dragões e monstros em masmorras? Viajar por planetas gerados aleatoriamente e encontrar raças bizarras? Não, eles vão patrulhar o bairro uma vez por semana (Na vida real) usando um sistema de "Patrulha". No começo da sessão, o Juiz determina uma dificuldade para cada herói, e os jogadores planejam como seus personagens patrulhariam e lidariam com os problemas que surgem aleatoriamente. Eis uma ficha de patrulha:
Os jogadores tem que planejar direitinho, por horas, como seus personagens agiriam na ilha de Inguria! Até mesmo quando iriam descansar, trabalhar e treinar. A interpretação de personagens é deixado para a resolução de tais cenas. Superhero 2044 não é meramente um RPG, como podem ver é um Jogo de Guerra também. Onde o foco está na simulação das situações e na geração delas por um sistema, ao invés de encarregar o mestre com uma campanha. É por isso que os jornais mencionados no começo dessa postagem são tão importantes para mostrar o que está ocorrendo pelo mundo, pois os jogadores estão mecanicamente presos a uma rotina ao qual eles mesmos criam para seus personagens. Como se isso não bastasse, os heróis precisam pagar contas, impostos e até mesmo processos que levam por suas ações.

Adeus para Inguria


Uma das classes do jogo

E este foi Superhero 2044. Há ainda no livro regras opcionais e extras que acrescentam a experiencia, fazem o combate um pouco mais agil e que geram "situações de handicap" que são quase como aventuras maiores, que mexem na dificuldade de se patrulhar na cidade positivamente ou negativamente. 

O sentimento que o livro carrega é quase como a de um Chainmail. Um pioneiro para algo maior. O livro é cheio de ideias coloridas e absurdas, e ele tenta quantificar em regras o que o gênero de super herói deve ser.  Grandes poderes, grandes responsabilidades, pressão do público, super crimes, roupas colada no corpo e muita ação envolvendo personagens icônicos, símbolos. Sua maior falha é justamente em tentar ser um hibrido e conciliar a novidade dos RPGs com a estratégia e simulação dos Jogos de Guerra. Mas para uma primeira tentativa é um jogo e tanto. 

O universo criado pelo autor é algo que não seria fora do lugar para qualquer revista em quadrinhos, mas vale apontar que ao em vez de criar algo ambientado na contemporaneidade como é o comum, o autor se inspirou na "Legião de Heróis" (Publicado pela DC) para criar um ambiente futurista. Houve também todo um cuidado em construir o cenário para que a existência de super heróis fosse algo desejado e "plausível". 

E de acordo com o autor, o objetivo de Superhero 2044 o objetivo era fazer um hibrido entre RPG e Jogo de Guerra, se usando de miniaturas e que não tivesse nenhuma conexão com D&D. Essa informação é muito interessante pois mostra que o gênero de super heróis para a modalidade de jogos de mesa nasceu tentando ser uma alternativa diferente de seus similares, tentando ser 'sua própria coisa" e não ser definido pelos jogos de fantasia ou sci fi que saíram na mesma época.

Podemos ver a influencia direta do sistema de compra e certos elementos do combate em Champions RPG e em Villains and Vigilantes, dois sistemas que ainda aparecerão por aqui na Playing Hero e que definem "RPG de Super Heróis" para ao menos três gerações de jogadores de RPG diferentes. Infelizmente elementos interessantes como o sistema de Patrulha que sim, foram feitos pensando em tentar criar um hibrido entre RPG e jogo de Guerra, poderia funcionar muito bem em qualquer uma das modalidades se sofresse refinamento nunca ressurgiu em um jogo mais popular como Mutantes & Malfeitores ou os outros dois mencionados anteriormente.

Na próxima postagem, conteúdo exclusivo da Playing Hero! Um jogo de herói perdido no escuro da vasta internet. 
Que a jornada pela saga do heroísmo interativo continue firme e forte!

Capa Original

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